Estou profundamente impactado com o poder de transformação e inspiração que os personagens de Dear… (a nova série documental da AppleTV+) tiveram na vida das pessoas. E como falara ontem em meu post, também tive uma inspiração que me guiou a carreira profissional e norteou muitas das minhas decisões e projetos que decidi assumir em minha vida.

E seguindo o que a série sugere, resolvi escrever uma carta para ele para agradecê-lo por ter transformado minha vida com textos, imagens e acima de tudo ótimas músicas.

Dear… Cameron Crowe

Escrevo esta carta para te agradecer por suas matérias na Rolling Stone, seus filmes e sua relação com cinema, música e jornalismo, e como ela foi capaz de guiar as minhas escolhas em minha vida profissional.

Desde adolescente eu sempre fui um apaixonado por música, cinema, esportes e por contar histórias. Quando o grunge emergiu em Seattle no início da década de 90, eu tinha 10 anos e começava a frequentar shows de rock com meu pai. A música entrava em minha vida para nunca mais sair. Assinaturas de revistas sobre música eram rotina. Mas, por morar no Brasil e naquela época a internet não ser tão difundida, ainda não tinha acesso a seus textos na revista Rolling Stone.

Meu primeiro contato com o seu trabalho foi em 1992 com Singles (pois é, pra mim você nasceu roteirista). A vida de Seattle já era um fascínio para mim, e você me transportou para o dia a dia do meu mundo imaginário. Minhas bandas favoritas, o cinza da cidade, as camisas xadrez. Eu vivi Singles como se fosse um dos personagens, tenho certeza que conversei com Jeff Ament, Eddie Vedder e Matt Dillon na cena no café, mas como ainda estou engatinhando no violão não fui aceito no Citizen Dick.

No video acima, integrantes de bandas como Pearl Jam, Soundgarden, Alice in Chains, Screaming Trees e Mudhoney falam sobre a participação em Singles, Cameron Crowe e como o filme ajudou a impulsionar os lançamentos de discos das bandas após a trilha sonora do filme.

O filme me marcou tanto que não acabou nos créditos na tela. A trilha sonora habitou por anos meu cd player. Paul Westerberg, Mudhoney, Screaming Trees, Smashing Pumpkins… ganharam espaço no meu cotidiano musical por causa de Singles. E com isso, revisitei várias vezes o velho DVD para reviver aqueles 99 minutos de puro prazer.

Mas foi com Jerry Maguire que eu percebi que meu mundo estava amplamente conectado com o seu. Que não era apenas o acaso de uma obra. Singles podia até parecer o one-night stand, mas Jerry Maguire confirmou o que eu imaginara: era um relacionamento sério.

Tom Cruise, Renée Zellweger e o desejo de mudar o modus operandi de uma das indústrias mais fascinantes do mundo foi libertador. Quem viu Jerry Maguire por alguns instantes da vida pensou em sê-lo. E, obviamente, tomar a atitude mais “estupidamente romântica” que um ser humano pode ter: acreditar em si mesmo e em seu propósito. Virou meu mantra e acabou com qualquer chance de ter medo de me reinventar em busca de algo que atendesse meu propósito de vida.

Naquela época, eu tinha 15 anos, e como filho de engenheiro, pensava em fazer engenharia química – ainda não havia conhecido a apavorante química orgânica. Jerry Maguire me fez pesquisar sobre você. Conhecer sua história. Descobrir o jornalismo como a forma de se contar histórias humanas e inspiradoras. E, consequentemente, ser um caminho para livros, filmes, documentários. Descobri a profissão que se encaixava com a minha vocação.

E escolhi o jornalismo. Não satisfeito em me ajudar na escolha, você quis ratifica-la quando estava no primeiro ano da faculdade, quando lançou um dos meus cinco filmes favoritos da vida: Quase Famosos. Posso jurar que você escreveu William Miller baseado nas minhas críticas de álbuns e artigos sobre bandas nunca publicados além do meu caderno de textos (apesar de saber que é um filme autobiográfico).

Quase Famosos trazia novamente o que sempre me impressionou nos seus filmes: a busca pelo propósito de seus protagonistas. Toda grande história tem um bom protagonista com um objetivo muito claro e são obstinados em alcança-lo, Cliff Poncier, Jerry Maguire e William Miller tinham isso. Os três mudaram minha vida e me guiaram no início de minha vida adulta.

Imagem do guitarrista Jimmy Page e do vocalista Robert Plant, integrantes do Led Zeppelin na capa da revista Rolling Stone

Em 2006, quando a revista Rolling Stone chegou ao Brasil, assinei-a de imediato. Li todos os seus textos que foram republicados aqui ao longo dos anos de assinatura. Cada entrevista com um de meus ídolos músicas, cada matéria de capa era uma inspiração para um passo adiante para mim.

Nesse mesmo ano, eu viajava a trabalho para minha primeira Copa do Mundo. Alemanha. Entrevistara boa parte dos grandes nomes do esporte brasileiro e alguns do internacional. Sempre seguindo o que Lester Bangs nos ensinou: não somos “cool” e devemos sempre ser honestos e impiedosos. Levei esses conselhos para a minha vida, pois eles são fundamentais para um bom jornalismo e uma boa história. Acredito que consegui escrever algumas e estabelecer boas relações profissionais graças a vocês.

               Outros trabalhos audiovisuais de Cameron Crowe:

2011 - Pearl Jam Twenty (documentário)
2011 - The Union (documentário)
2016 - Roadies (série)
2019 - David Crosby: Remember my name (documentário)

Por falar em Lester Bangs, adoraria conhece-lo um dia. Quem sabe não sentamos nós três e conversarmos sobre cinema, jornalismo, música e as coisas que pessoas “uncool” fazem… obviamente, ouvindo bons álbuns de Rock N’Roll. Talvez, tenha coragem de mostrar para vocês meus dois documentários independentes. Enquanto esse dia não chega, sigo te agradecendo por ter me inspirado e sido meu guia nessa fantástica jornada de jornalismo, música e cinema que tem sido a minha vida.

Peace,

Jefferson Rodrigues

escritor, roteirista, documentarista, produtor e criador de conteúdo freelancer

Sócio da Lisoca Criação de Conteúdo

Diretor e Produtor Executivo do premiado documentário As Copas por um clique (2018)

Diretor, Roteirista e Produtor Executivo do premiado documentário Radar! Um time! Uma nação! (2019)

Autor do livro Um voo para a vida.